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Repostado de @fraternidadedeescritores . Nesta série de livros de ficção científica nacional, o termo C7i designa tanto uma série de protocolos assinados pelas principais agências de inteligência do mundo no final do século 19, quanto um departamento invisível e multinacional que se reportava, ao menos no início, a estas agências. . Agora, em meados do século 23, operando nas sombras de uma nova civilização humana, C7i é conhecido por seus membros e os poucos que sabem de sua existência como A Agência. . Enquanto a humanidade vive sua era de ouro, com a tecnologia e as evoluções culturais transformando o mundo em uma quase utopia, a Agência cuida para que a extinção humana — que está prestes a ocorrer, por conta do inevitável encontro com forças externas fundamentalmente incompatíveis com nossa existência — seja adiada o máximo possível. . Ao mesmo tempo, C7i busca desesperadamente encontrar um meio de virar este jogo, e para isso a Agência conta com especialistas recrutados entre as mentes mais brilhantes da humanidade, cujas mortes são forjadas para que eles passem a servir em tempo integral como Agentes Diplomatas na Agência. . Estas mulheres e homens tragados para dentro do labirinto que é C7i são a nossa linha de frente na exploração de novas realidades, do espaço inóspito, e de mundos os mais distantes e sombrios, e para enfrentar as forças aterradoras que vêm de lá. . A maioria de nós nunca vai saber que essas pessoas existiram, nem como viveram ou morreram, mas cada um de nós, humanos, devemos absolutamente tudo a eles. Os livros desta série vão narrar algumas de suas histórias e de seus antagonistas. . © @wagner.rms & @bianca.jadore . Conheça no site da Fraternidade de Escritores: https://bit.ly/c7i-serie . Concorda que você, sua gente e sua cultura têm que protagonizar o futuro e o fantástico? Então Curta, Comente, Salve e Compartilhe. __________ #C7i #WagnerRMS #Scifi #FicçãoCientífica #FraternidadedeEscritores https://www.instagram.com/p/CWzlZZXL5qS/?utm_medium=tumblr
Concatenar uma série tão longa e detalhada, cuja ideia é construir uma Space Opera com dinâmica de ação, extrapolando o mínimo possível ciência e tecnologia do Sci-Fi Hard é tremendo desafio. Mas não basta ir ao espaço e se aventurar em fugas e escaramuças, tem que mergulhar no Novum e no que se aproxima o mais possível do Alienigena, desaguando naquela extraordinária sensação de estar de fato diante de cultura, artefatos e constructos mentais feitos por um alguém sim, mas cuja ancestralidade e a mente absolutamente nada tem a ver com o planeta Terra.
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Leia Agora o Capítulo 1 deste novo livro:
Desta vez foi Milena quem — assim pareceu a Borges — resmungou um palavrão. Algo como um sonoro “que merda”. Eles estavam espremidos um contra o outro, tentando se mexer no escuro, iluminados apenas pelas luzes de seus trajes, sob um monte daquelas anteparas orgânicas que os protegeram da explosão e da subsequente avalanche. Os dois pareciam marionetes cujos cordões se enlaçaram e arrebentaram, fazendo os bonecos caírem em caos, Ramirez sobre Guilherme. — O que foi que você falou, Milena? — Fui lerda! Eu fui a porcaria de uma lerda! Quase matei nós dois. Estou furiosa comigo! Borges bufou, e respondeu: — Eu e você adivinhamos o que o monstrinho alienígena queria dizer, e nos safamos. Para de se tratar como uma super-heroína. Você é só humana, Milena! Mas, por outro lado, tudo bem, continue cuidando de mim, garota! Milena não respondeu. Borges então disse: — E você não vai mesmo me deixar na mão nunca, não é? Nem que eu merecesse me foder... isso é algum trauma, Ramirez? Perdeu alguma menininha numa investigação, enquanto era policial, e agora quer salvar o mundo? — Deixa pra lá, Guilherme. Após um momento, uma fagulha de temor surgiu na voz do bioquímico quando ele perguntou: — Isso foi algum tipo de... Ordem? Silêncio. E com um resmungo de desconforto, o homem mudou, enfim, a direção da conversa: — Olha, mesmo com as plantas-anteparos, se não fossem nossos trajes a explosão tinha rasgado a gente ao meio, ou pelo menos torcido nosso pescoço, feito galinhas num abatedouro! — Cruzes, que imagem horrível. Eu não consigo achar um ponto de apoio, Guilherme. — Ok, deixa eu ver se consigo virar… peraí… ugh… tira a perna... que porra! ... — Ele girava o máximo que conseguia o próprio tronco. Algo cedeu! Abruptamente eles afundaram mais nos escombros, enquanto tentavam segurar um no outro, a beira do pânico.
Para sorte de Guilherme a nova avalanche parou um segundo antes dele soltar um indigno grito quase histérico de terror, que chegou a lhe subir pela garganta, e se esboçar no rosto do sujeito.
— F-foi outra explosão? — Disse ele, ofegante e em evidente exaspero, logo que tudo se aquietou.
— Não. Nossos auriculares externos, assim como nossos alto-falantes externos, continuam ligados, reparou? Nós teríamos escutado o estrondo, mesmo que distorcido pela atmosfera estranha dos ammons.
Por um instante que pareceu alongar-se dali até se perder na escuridão que os cercava, Borges ficou olhando para o rosto de Ramirez, iluminado pelas luzes internas do capacete. Já ela, por sua vez, lançava a vista para trás, por sobre o próprio ombro, olhos arregalados e boca tensa, como quem espera que algo salte da escuridão sobre suas costas. Guilherme engolia em seco quando, de repente, Milena voltou o rosto para baixo, primeiro para dentro do próprio capacete e seus mostradores internos, e depois para o parceiro, e emendou em um quase sussurro:
— Estamos inclinados aproximadamente vinte e cinco graus, na direção dos nossos pés, a colina toda não ruiu, mas tá cedendo, e ainda estamos escorregando. Bem devagar, mas estamos, e o entulho tá pressionando um pouco mais.
Borges apurou os ouvidos, e lá estava o sutil chiado que os captadores externos de seu capacete lhe traziam. Era o som da placa vegetal, contra a qual estava deitado de costas, raspando nos escombros, enquanto a situação se agravava. Na verdade, de toda parte vinha um ranger abafado, mas forte, que ao sujeito parecia o ranger de dentes imensos, rilhando-se uns nos outros, mastigando-o, afligindo-o.
Com o peito oprimido, provavelmente por conta de seu traje estar decidindo quais músculos artificiais flexionar para protegê-lo da nova situação, Guilherme Borges, ainda mais sem fôlego, resmungou, desconexo, enquanto começava a se contorcer:
— Sair… agh! Porra!
— Sim, Guilherme, — respondeu Milena, a voz surpreendentemente mansa, enquanto olhava-o nos olhos e segurava, da melhor forma que podia, o parceiro no lugar — precisamos sair daqui, antes que a gente afunde de vez, mas com cuidado! Me dá suas mãos, estamos praticamente de frente um pro outro, acho que não vai ser difícil...
Ainda assim, mesmo com a posição favorável, não foi fácil, mas acabaram por conseguir, deram-se as mãos, seus dedos se entrelaçaram, e Milena falou novamente:
— Isso, obrigada. Agora ordene que seu traje enrijeça completamente. É possível fazer isso, eu vi nas memórias implantadas, confere aí e faz isso, por favor, eu preciso de uma base firme pra tirar a gente daqui, e vai ter que ser você, que não tá exatamente firme, mas é o melhor que nós temos.
Sem hesitar Borges fez o que sua parceira pediu, e comandou seu traje para que este enrijecesse. Logo a seguir o sujeito sentiu a pressão da força que a parceira fazia sobre ele. Milena estava usando Guilherme como apoio, para forçar os próprios músculos, e as equivalentes fibras artificiais do traje dela, a empurrarem os sedimentos que estavam acima de si, e sobre ambos. Entre os dentes, enquanto ela fazia toda a força que podia, a jovem mulher foi explicando:
— O traje… me diz… que a saída daqui… está… na direção… das minhas costas.
— Sonar. Você tá usando sonar?
— O giroscópio e o sonar... sim, o traje possui essa tecnologia… nnnng!... — O rosto moreno de Milena ganhando um tom avermelhado nas faces. — Na sua... direção, tudo sólido… um pouco mais pra... cima das... minhas costas… nããão!
Luz, tenebrosa e alienígena, mas ainda assim luz, surgiu de repente, entrando por uma fresta nos escombros, que se abria logo atrás de Ramirez. Após injetar esperança na treva em que eles estavam, a réstia de luz externa se foi, e o ranger dos escombros cresceu. De algum lugar vinha um lamento, como o de metal retorcendo, gritando, cada vez mais perto de se partir em pedaços! Mas logo o som se calou e tudo clareou de novo, e mais intensamente.
Milena soltou uma das mãos de Borges e ficou de joelhos. Às costas dela o homem enxergava fragmentos escuros saltando sobre eles, e a toda volta a luz revelava um tipo de barro esfarelado, e dezenas, centenas, milhares talvez, de placas vegetais com pontas esgarçadas, pequenas e muito grandes, tudo se movendo. Era o que sobrou da vegetação e da camada superior da colina, esfregando-se e raspando-se umas sobre as outras, em um desmoronar lento e inexorável.
— Vem Guilherme, rápido! Precisamos ficar em cima desta placa aqui, olha aqui, esta aqui!
Ramirez apontava e puxava o parceiro, que então reagiu e destravou os músculos artificiais de seu traje. Juntos conseguiram sair de onde estavam e montar em um grande pedaço plano de escombro que descia por sobre o restante. Um momento depois eram os dois agentes que deslizaram e, enfim, se firmaram com as solas de suas botas no chão do ninho ammonita.
Assim que saiu do abraço mortal dos escombros e tocou o piso livre de destroços, Borges deus uns pulinhos e ergueu os braços, em uma quase
dancinha da alegria
, contendo uns gritos extasiados. Depois fingiu estar alongando músculos doloridos:
— Ah, esses braceletes tinham que nos manter inteiros! Tô todo dormente! Essas merdas inúteis será que estragaram?
Ao contrário do colega, assim que tocou o chão Ramirez se manteve agachada. Com o rosto se movendo de um lado ao outro, seus olhos transformados em riscas azuis. A agente rastreava a escuridão.
— Altera o modo de visão do seu capacete para infravermelho. — Ela sussurrou para o companheiro, em raro tom autoritário — E desativa os falantes externos.
A treva total de dentro dos escombros fez parecer aos humanos, em um primeiro momento, que o lado de fora era muito mais luminoso, mas na verdade o entorno dos dois humanos era uma mistura daquele tom vermelho escuro soturno e nevoento da atmosfera dos ammons. E a luminosidade estava reduzindo ainda mais. Aos poucos tomava conta do lugar um negrume profundo, embora não impenetrável, com nuances arroxeadas, e que parecia vir escorrendo do longínquo teto da caverna que é o interior da nave ammonita. Essa penumbra fosca e lúgubre parecia mais que a ausência de luz, era como se fosse algo real, feito óleo queimado e pegajoso. Mas não era. Aquilo era a noite viscosa, úmida e glacial do ninho ammon, turva e aparentemente solitária até onde a vista alcançava. No entanto, assim que mudou os receptores visuais de seu capacete para o infravermelho, conforme sua parceira lhe disse que fizesse, Guilherme Borges se surpreendeu!
Havia como que pirilampos incandescentes para todo lado, feito riscos de luz e estrelas cadentes cruzando o ar, e uma miríade de outras formas vagamente fluorescentes, que ora surgiam, ora eram eclipsadas, oscilando por todo lado. Mesmo ele, sujeito pragmático, especialmente quando sua vida estava em risco, não pôde deixar de ver certa beleza naquelas riscas serpenteantes que pareciam ficar fosforescentes em infravermelho. Bem perto deles, diversos filetes verticais de luz esmaecida vibravam, coleantes. Essas listras de fogo-fátuo seguiam padrões, que se tornavam mais perceptíveis conforme se olhava para eles, como se brilhassem, um conjunto aqui, outro acolá, cada grupo parecendo estar aderido em diversas superfícies alongadas.
Normalmente Borges atiraria primeiro, mas será que algo bonito assim tinha que ser realmente perigoso?
Talvez por perceber a expressão dos olhos de Guilherme, ou talvez por adivinhar mesmo seus pensamentos, por causa de alguma dessas intuições que as mulheres têm, Ramirez falou, pelo rádio dos trajes:
— Estamos em perigo, cercados! Está mais escuro, deve ser noite ou estão enchendo a região de algum gás escuro. Mas esses riscos serpenteantes, eu tenho certeza, são ammons. Eu não sei te explicar como eu sei, mas eu sei. Esses caras não são nossos amigos, Guilherme.
Próximos o suficiente para serem vistos com luz normal, e estando Borges agora atento aos mínimos movimentos do inimigo, o agente logo fixou olhar em um daqueles seres em forma de verme, que trazia consigo uma daquelas tabuletas deles, igual àquela que o primeiro ammon começou a usar para comunicar o que queria dizer aos humanos.
— O tablet, Milena. — Disse Borges, indicando com um movimento dos olhos o aparelho que um dos ammons carregava. — Posso inferir a língua deles com aquilo.
Dado o tamanho e os vapores sulfurosos que aqueles valentões que os estavam cercando soltavam agora, a resposta de Milena foi:
— Esquece, Guilherme, a situação não está pra papo...
A prioridade agora era, prosaicamente, ele e Milena saírem dali vivos. Entendido.
— Venha, recue. — Depois de empurrar o parceiro mais para trás de si, Milena estava, Borges percebeu, plantando a postura de base que costumava tomar quando estava prestes a partir pra porrada. Foi quando os terrestres viram os ammon-v, as colossais criaturas que acolhiam os ammons-a, aqueles mais inteligentes e vermiformes, dentro de si. Ammon, sem a letra final, era o nome usado genericamente para descrever um ou ambos os tipos.
Boquiabertos, os humanos recebiam dentro de seus capacetes a informação de que aqueles vultos colossais, cujos corpos quase humanoides e imensos rasgavam agora o nevoeiro, feito montanhas com dezenas de metros de altura brotando e dissipando parte da escuridão. Os ammon-v estavam há cerca de trezentos metros de distância e se aproximando, circulando pela área onde ocorrera a explosão. Alguns dos monstros gigantes pareciam agarrar coisas no chão e enfiá-las nas bocarras.
— Caralhôôô... p-precisamos sair daqui... — Murmurou o homem da Terra, e então, voltando-se para sua companheira, gritou: — Milena!
O primeiro dos ammons-a que cercavam os terrestres atacou, atirando-se sobre os humanos. Mas Milena simplesmente o empurrou para longe com uma pancada dada com seu ombro que atingiu, certeira, o flanco do alienígena agressor. Vendo o companheiro rolar pelo chão, se contorcendo, os outros ammons pareceram, aos olhos de Guilherme Borges, gritar por suas fendas de sintetização de compostos químicos, borbulhando líquidos rubros e alaranjados, e evaporando rolos espessos e cinzentos de fumaça por estes orifícios.
Aquele ammon que possuía o tablet alienígena estava muito mais calmo, e exibiu o aparelho que carregava, erguendo-o no ar, e nele havia a representação gráfica de dois bonecos humanoides que, submissos, deitavam-se no chão, repetidas vezes, e eram cercados pelo que só poderia ser um bando de ammons.
— Nem pensar, bonitão! — Disse Guilherme. — Não me entrego fácil assim não.
Sem aviso, um dos ammons mais próximo cuspiu sobre os agentes um líquido que se espalhou como uma névoa fina e grudenta, e encharcou os terrestres. Imediatamente sensores e monitores dos trajes dos humanos detectaram e informaram que aquilo era um ácido muito potente. Dentro do capacete de ambos os agentes alarmes piscavam, indicando que se tomassem mais algumas rajadas daquela substância, a integridade das armaduras deles poderia ser comprometida.
Milena, como de hábito, reagiu prontamente, e partiu para cima daquele ammon que cuspiu o ácido, chutando-o com destreza e com tamanha força, que uma de suas fendas, que estava fechada, provavelmente manipulando mais ácido, estourou como um cano de vapor rompido. O ammon, engolindo o próprio veneno, desabou ao chão, entrando em convulsões, e com bolhas se formando e estourando em toda a sua grossa pele. Isso abriu uma brecha na fileira dos ammons agressores, que recuaram, aparentando pavor instintivo diante da violência do ataque da humana.
— Vem, Borges! Corre! Corre! Corre!
Guilherme Borges disparou atrás de Milena, mas, em um arroubo de coragem que nem ele mesmo entendeu, voltou atrás alguns passos e arrancou a tabuleta do ammon que estava com ela, com um puxão tão forte (mais por conta dos músculos artificiais do traje, evidentemente, do que pela um tanto franzina compleição física do bioquímico) que quase arrancou as dobras da parte do corpo onde o alienígena segurava o aparelho de comunicação. No entanto, este movimento de captura da tabuleta não lhe saiu de graça, e Borges viu um clarão e sentiu uma pressão terrível, quando algum tipo de granada de efeito moral ammonita explodiu perto dele. Seu traje resistiu, mas, devido à concussão desorientadora, Guilherme não conseguia fixar nada, e bamboleava, terrivelmente tonto. Seus olhos, duas próteses visuais artificiais muito sofisticadas, estavam captando o ambiente sem nenhuma distorção, elas não ficavam ofuscadas em praticamente nenhuma hipótese, mas o cérebro do homem, chacoalhado pela explosão, estava truncando seus sinais nervosos, e o agente terrestre rodava nos eixos, como um foguete sem giroscópio. Alguém agarrou Borges e o puxou com força. Ele, reagindo muito mais instintivamente do que racionalmente, socava o ar repetidas vezes, com a mão livre — a outra ainda agarrava obstinadamente a tabuleta alienígena —, até que a desorientação diminuiu o suficiente para Guilherme perceber que a voz de Milena dizia, dentro do seu capacete:
— Calma. Sou eu! Sou eu, Milena! Vem, corre!
E novamente Borges disparou atrás de sua companheira de missão, que o puxava. Ele chacoalhava a cabeça, enquanto seus pés faziam o possível para acompanhar o ritmo de Ramirez, que, a certa altura, empurrou o homem à frente e voltou atrás. Quando recobrou o controle, Guilherme viu Ramirez mais atrás, uns três metros antes, atracada de novo com os ammons. Os olhos do agente, já naturalmente grandes, se arregalaram. Eram muitos alienígenas contra uma só humana!
— Bracelete! — Bradou Guilherme ao sistema que carregava no pulso, cujo processador, além de potente, era dotado de inteligência, embora não de autoconsciência. No interior de seu capacete um sinal visual indicou que seu bracelete estava ouvindo, e, paralelamente a voz monocórdia do mesmo sistema disse, simplesmente:
— Sim, agente Borges?
— Quais os pontos frágeis da fisiologia ammonita? Fala rápido!
— Desconhecido. Está incapacitado de acessar seus implantes de memória?
— ... Estou, porra. Qual o calcanhar de Aquiles deles? Algum troço que fira ou irrite muito esses merdas?
— Contusões parecem os ferir normalmente, quase como a um humano em seu habitat normal.
— Veneno! Veneno? Pode sintetizar algum catalisador… não, claro que não. Espere. Queimar! Você pode fazer o hidrogênio desta atmosfera incendiar? Aqui tem muito hidrogênio! Pode gerar o oxidante, bracelete?
Ali perto Ramirez desviou de uma nova rajada de ácido, agarrou um ammon e o arremessou sobre os outros, bem a tempo de se agachar, curvada sobre si mesma, feito uma concha se fechando, e ser atingida por outra bomba de concussão, que Borges viu sendo cuspida por um dos outros ammons.
— Liberando oxigênio do seu tanque, e depois provocando a explosão, podemos queimar parte do hidrogênio pressurizado desta atmosfera.
Borges desviou o olhar do próprio antebraço, onde estava o bracelete, até a cena onde sua parceira se ergueu e voltou a brigar ferozmente com os ammons, mas era visível que, pouco a pouco, Milena perdia terreno, e logo seria dominada, pois eles eram vários ammons atacando-a, e a cada instante pareciam chegar mais e mais deles. E, pior, quando pegassem Ramirez, viriam atrás de Guilherme!
— Ah, sem chance! — Disse ele em voz alta, respondendo à sua própria conclusão. E, rapidamente, para o próprio pulso, questionou: — Bracelete, nossos trajes podem aguentar a combustão?
Após uma fração de segundo, que a VRP do bracelete levou fazendo intrincados cálculos cujas equações zuniram em uma janela de dados projetada dentro do capacete do agente, e durante o qual, certamente, decisões táticas foram consideradas, sobre se o percentual de risco da ação solicitada era válido para se completar a atual missão dos agentes, veio a resposta:
— Uma liberação controlada de cerca de três vírgula setenta e quatro por cento do oxigênio concentrado no gel do tanque do seu traje deve ocasionar uma detonação controlada, suportável por suas blindagens.
— Os ammons se ferram? O oxigênio que me resta vai me manter vivo por quanto tempo?
A inteligência do bracelete de Borges entendeu facilmente quais eram as duas perguntas, pois respondeu de pronto:
— Os ammons próximos devem sofrer ferimentos consideráveis. O oxigênio restante ainda deve permitir a sobrevivência do usuário por pouco menos de uma semana da Terra, se a média intensa de consumo continuar a mesma.
Era uma margem muito boa. Guilherme já corria em direção à Milena, enquanto ordenava ao seu bracelete:
— Comece a liberar o oxigênio! Provoque a ignição quando eu gritar… sei lá… queimar! Não, caralho, queimar não. Porra, o que?... Já sei, foda-se, ouviu bracelete? Assim que eu gritar foda-se!
— Iniciando liberação do oxigênio. Palavra-chave ignitora: foda-se. — foi a resposta, sem nenhuma entonação emocional, do bracelete de Borges.
E assim Guilherme passou correndo entre Milena e seus agressores, vendo apenas os olhos cor de anil arregalados da mulher, que não deve ter entendido o que Borges fazia ali, correndo feito um garoto desajeitado, gritando coisas desconexas, bem no meio da pancadaria. Ele deu a volta, fintando o melhor que pôde os ammons, feito um jogador de futebol americano mais sortudo do que realmente competente, livrando-se de dois, três, e sendo derrubado pelo quarto dos alienígenas, que se ergueu sobre o terrestre como um urso enorme prestes a esmagar o humano. Mas, para piorar, este urso infernal respingava ácido.
— Guilherme! — Gritou Milena, apavorada, pois estava longe demais para acudi-lo.
— Fo-da-seeee! — Evidentemente que não era preciso gritar, muito menos enfatizar a palavra silabicamente, mas ele gritou assim mesmo, deste jeito, e tão alto que sua cabeça, seus dentes, e até mesmo os seus olhos pareceram vibrar.
Em resposta, quase imediatamente, do ponto onde o bracelete de Borges emergia do punho do seu traje, um diminuto pedaço deste mesmo bracelete se projetou, alongando-se, e emitiu uma pequenina fagulha. Uma serpente de fogo surgiu em um instante, e tudo explodiu em luz e chamas, parecendo a quem estava ali próximo que o mundo inteiro havia sido convertido em labaredas radiantes!
Mas como o oxidante essencial daquela ignição era o oxigênio, e ele se esgotou rapidamente, a combustão também foi razoavelmente curta, embora sua temperatura tenha sido bastante alta.
Logo depois da explosão, os terrestres se viram no meio de cinco ou seis ammons, que estavam com grandes trechos de suas peles enegrecidos e quebradiços, e que se debatiam no chão, ferindo-se ainda mais. O restante dos atacantes alienígenas corria para longe. Milena estava de pé e girando lentamente, enquanto murmurava, com olhos tristonhos e a voz embargada:
— Oh, estão feridos… estão agonizando… não sei o que fazer… estão sofrendo, coitados… o que eu faço?... Estão sofrendo... agonizando...
— Oxigênio, eu explodi tudo! Corre, Milena, porra! Pra merda esses bichos!
E desta vez foi ela quem obedeceu, tomando ligeiro susto a princípio, ao ser subitamente puxada pelo parceiro, mas agindo logo a seguir, sem titubear, e correndo atrás de Borges.
Juntos, os humanos dispararam nevoeiro adentro, enxergando apenas através dos sonares de seus trajes. Eles nunca correram de fato assim, quase às cegas, apenas com os capacetes desenhando o melhor possível — visto a alta velocidade com que o aparelho tinha que produzir tais imagens — os obstáculos, encobertos pelo espesso nevoeiro da atmosfera ammonita, no desconhecido e potencialmente fatal caminho à frente. Mais uma vez, eram as memórias de treinamento implantadas em seus cérebros que lhes vinham em socorro. Eles se recordavam de simular em treinamento aquela situação extrema. Rememoravam tais lembranças quando ativamente solicitadas, ou quando a adrenalina inundava seus corpos, o que era exatamente o caso naquele instante.
Correram com o sangue trovejando nas veias, sem olhar para trás, olhos arregalados, mas sem conseguir ver, de fato, por onde corriam. Uma interminável disparada para o que poderia ser a salvação ou para o abraço trevoso de seus inimigos, ou de outros terrores ainda desconhecidos e ainda piores naquele mundo sombrio. E como que para sublinhar essa agonia, sem o menor aviso, dentro de toda aquela escuridão, Milena e Borges foram engolidos por um tipo de mata densa. Grande quantidade de chicotes, enraizados no chão e estendendo suas longas e delgadas hastes cinzento-arroxeadas para o alto, começou a chibatar os terrestres por todos os lados, quase os fazendo tropeçar.
Mas, passado o susto inicial, quando pararam de correr e chegaram mesmo a retroceder alguns passos, os humanos começaram a avaliar o lugar que os cercava agora. As folhas do mato eram longas, quase lhes chegando à altura das cabeças, e eram grossas, mas também relativamente largas, e bordejadas de cílios que se agitavam como pequeninas larvas. Breves varreduras com os sensores de seus trajes, e lançamentos fortuitos de seixos e gravetos em torno de si, mais para o meio daquilo que parecia ser grama alta, foi o máximo de testes que conseguiram fazer. De resto, concordaram em uma breve conversa, era torcer para que o matagal alienígena fosse seguro, não havia como procurar outro esconderijo.
Entraram juntos, e ao se abrigarem mais lá para dentro da exótica vegetação, agachados sob a cobertura que ela lhes proporcionava, descobriram as estruturas. Eram montículos perfeitamente organizados de coisas. A maioria fragmentos sortidos da sociedade humana, tais como bolas de bilhar, dados de jogo, tablets de pulso, bijuterias, talheres quebrados, tubos de cremes vazios, e etc.
— Que aparelho é este? — Fez Milena, apontando, sem tocar, para um pedaço retangular de algo composto por plástico, metal, e um monte de corrosão.
— Um tipo de tablet do passado. Ah, tá sujo, arranhado, cheio de bagulho em cima, mas você já deve ter visto em filmes bem antigos, não? — Respondeu Borges, entre os dentes. — Creio que se chamava smartphone, mas o negócio era tão esperto quanto uma ameba amestrada, na verdade.
— É mesmo, Guilherme, verdade, tinha esquecido, um smartphone, olha só... ainda mal sonhavam com o amplo uso da optotrônica e memluztores nesta época. Olha lá, mais montes de coisas! Tem desses... totens em todos os lugares, espalhados pelo mato.
— Totens. Bom nome. Ok. Vamos dar uma olhada naquele lá.
Acabaram encontrando outros totens, em menor número se comparados com os montículos de objetos terrestres, que exibiam apetrechos ininteligíveis. A maioria parecendo já muito gasta pelo tempo também. Os terrestres foram investigar um desses amontoados peculiares.
— Aposto, Milena, que isso vem de outras culturas, sem ser a nossa. O que será isso ali, ó? Tá vendo? Parece uma série de recipientes de vidro que brotaram uns dentro dos outros. Vê as enervações? Será uma garrafa de uísque de outro mundo? Ou algum tipo de flor inflada e cristalizada? Um crânio? Um tipo de casco ou unha bulbosa? Fascinante, né não? Bom a gente não tocar em porra nenhuma dessas merdas...
Milena torceu o nariz, mas aquiesceu, silenciosa e parecendo um tanto assombrada, olhando em volta. Ambos resolveram explorar um pouco mais além, e confirmaram que os totens ammonitas, de fato, se espalhavam por todo o matagal alienígena, montículos de histórias humanas ou não, imersos entre um mar dessa grama estranha e alta. Guilherme Borges continuou:
— Reparou uma certa regularidade nesses totens? Isso aqui deve ser algum tipo de arquivo de referência, acho, para pequenos objetos talvez (imagina o arquivo pra coisas maiores!). Vai ver que esse matagal é alguma base de dados, ou mostruário.
— Acha que isso pode nos comprometer? — Quis saber Ramirez, atenta agora. — O próprio matagal pode nos sentir, ou alguma coisa assim, e nos expor aos ammons?
— Até agora tudo bem. Vamos torcer para que isso aqui seja um tipo de arquivo morto.
Voltavam para próximo do ponto onde eles entraram no matagal, quando Milena os fez parar, dizendo:
— Não temos localização por satélite aqui, só temos um o traje do outro como referência, então até podemos nos perder, mas eu posso apostar que aquele monte ali é onde encontramos o smartphone... E esse totem, que estava sozinho, não tá mais...
Guilherme, que vinha logo atrás da mulher, e começava a se entreter com o tablet que tirou do ammon, levantou a vista quando a parceira o parou, e estremeceu com o que viu, recuando um passo, arregalando os olhos, e dizendo:
— Porra! Não, esse troço não tava aí!
Ao lado do monte de coisas humanas, havia um obelisco de ébano, com uns dois ou três metros de altura, Borges nem atinou usar os sensores de seu traje para lhe dar medida exata. Milena, no entanto, ergueu o pulso onde podia manipular diretamente o teclado projetado de seu bracelete de dados, e iniciou uma sondagem. Após um momento, balançou a cabeça, e murmurou:
— Os feixes dos sensores encontram esse negócio, mas parece que resvalam nele, não dão resultado positivo nem para a distância que ele está de nós.
— Mas... ele tá bem ali, na nossa frente.
— Eu sei, mas nossos sensores não concordam com nossos olhos.
Aproximaram-se cautelosamente do obelisco, e de fato conseguiram chegar rapidamente perto de algo que seus sensores não conseguiam definir bem se estava dois metros à frente, ou adiante alguns quilômetros.
Os agentes rodearam o objeto, e em vários momentos relataram, um ao outro, sensações de vertigem ao olharem para as superfícies laterais do obelisco a partir das suas arestas.
— Eu vejo que a superfície é relativamente curta, uns cinquenta centímetros, talvez. — Murmurava Guilherme. — Mas meu cérebro insiste em me fazer sentir como se eu estivesse olhando a beira de um abismo fundo pra caralho... que merda...
Milena fez menção de tocar uma das faces do obelisco, mas Borges a impediu, ao que ela foi dizendo:
— Calma, eu não pretendia tocar. Queria apenas sentir se há algum tipo de aura, ou força em torno dele, que deixe a gente enjoado assim.
— Basta não olhar pelos cantos dele. Tem que encarar esse troço de frente, e pronto. Pelo menos nossos sensores indicam que não há radiação letal aqui.
Depois de atirar pedrinhas no obelisco, tocá-lo com hastes da grama, e aspergir um pouco do granulado solo daquele lugar nele, finalmente os dois tocaram, com suas mãos enluvadas, naquela superfície absolutamente negra, e deslizaram os dedos sobre ela.
— É como tocar... vidro... vidro ligeiramente amolecido... — disse Borges, buscando, uma a uma, as palavras.
— Pra mim, apesar de estar usando luvas agora, me lembra a sensação de tocar a pele de uma orca, quando ela nada com intensidade, com fúria.
Guilherme Borges ficou olhando para a parceira, a mão ainda tocando o objeto alienígena, e depois de um momento, ele sorriu, e disse:
— Tá de sacanagem, Milena?
— Como?
— Você já tocou numa baleia assassina furiosa?
A mulher sorriu, torceu o nariz por um segundo, seus olhos azuis luzindo em contraste com sua pele de bronze. Enfim retrucou, simplesmente:
— Islândia. E a raiva não era por minha causa.
Ficaram ali, observando o objeto por mais algum tempo, mas, apesar dos totens estranhos e perturbadores, e do recém-descoberto obelisco enigmático, nada de verdadeiramente ruim aconteceu aos humanos, enquanto se escondiam naquele matagal, e eles puderam, enfim, encontrar uma pequena e bem camuflada clareira, e recuperar o fôlego ali.
Minutos depois de se refugiarem nesta clareira, Guilherme, que havia se sentado e recomeçado a mexer na tabuleta de dados ammonita, percebeu que Milena estava cabisbaixa. Não havia como ficar de pé sem aparecer acima do matagal, então Ramirez estava de cócoras. Seus olhos estavam fitos no chão, como se buscasse ouvir algo distante, ou como se estivesse perdida em reminiscências.
Apesar de soltar um resmungo contrafeito, Borges se levantou e, também se movendo abaixado, foi até Milena, pegou a parceira gentilmente pelo pulso, e disse:
— Obrigado por nos manter vivos mais uma vez, Ramirez.
Ela ergueu seu rosto de traços delicados, com seus grandes olhos brilhando, úmidos e respondeu:
— Você nos salvou, usando seu oxigênio para explodir eles. Eu que tenho que te agradecer, obrigada. E... obrigada por tentar me animar, mas… eu queria ser melhor em curar do que em ferir, Guilherme. Queria muito isso.
Ele ficou olhando para ela longamente. Milena, ainda transpirando tristeza, se afastou um pouco e se ergueu, furtiva, espiando por sobre o mato. E entrou nele, dizendo:
— Vou até a borda do matagal, volto já.
E, depois de um tempo, Borges disse, para si mesmo:
— Meu oxigênio... — E o agente terrestre sentiu, de repente, um medo profundo e inexplicável. Por um instante fugaz Guilherme soube que aquilo que fez, queimando seu oxigênio, iria pôr ideias na cabeça de sua parceira, que era propensa a heroísmos. Ideias muito perigosas. Mas como vieram, aqueles pensamentos subitamente se foram. Sobrando apenas uma vaga angústia.
Continua...
VRP: (Virtual Reality People): Toda e qualquer Inteligência Artificial (I.A.), pois todas são baseadas em um mesmo sistema algorítmico, conhecido como Vínculo Matriz-Conceito de Maia (Maia - 2010), ou Algoritmo de Maia. Uma VRP é uma "pessoa sintética", que pode ter as mesmas capacidades intelectuais de um humano, ou ser muito superior, intelectualmente, a este. Uma VRP ainda pode existir somente como um software dentro da VRnet, ou ter toda uma estrutura de hardware, que pode ser um poderoso computador quântico ou um optotrônico EpChip (Encefaloprocessadores Matriciais). Por força de Lei Constitucional Mundial, toda VRP deve ter seus algoritmos (o essencial Algoritmo de Maia e todos os paralelos) dependentes do Algoritmo Ozimov, que é uma técnica que consiste em um algoritmo de aprendizagem de máquina, cuja função abstracional está focada na identificação de contexto de situações decisórias da Inteligência Artificial na qual está implantado, sopesando tais decisões de acordo com três critérios a saber: quanto bem causa, quanto mal causa, e quanta justiça gera. Como os instintos mais básicos e inescapáveis do ser humano, numa VRP o Algoritmo Ozimov está na raiz de cada decisão e recorre a um banco de dados de situações éticas básico, mas amplo, que, no entanto, vai crescendo de acordo com a vivência da máquina. Ou seja, a máquina não toma nenhuma atitude sem que esta passe primeiro pelo Algoritmo Ozimov (isso está garantido tanto por estruturas de software quando de hardware dedicado ou não, e está previsto em cláusula da Constituição Mundial como de uso obrigatório, sendo crime gravíssimo a fabricação de robôs sem essa salvaguarda. Vale notar que, não raro, a Agência Código 7 usa VRPs de vários tipos, de robôs a softwares, sem ou com uma versão o Algoritmo Ozimov modificada, que permite, por exemplo, que seus robôs de segurança portem armas mortais e façam uso delas), e quanto mais atitudes éticas a máquina sopesa e compreende, mais refinado fica o algoritmo. O nome do algoritmo é a pronúncia do sobrenome em russo do bioquímico e escritor de ficção científica Isaac Asimov, criador de contos e romances protagonizados por robôs que seguiam fundamentalmente as Leis da Robótica [http://pt.wikipedia.org/wiki/Leis_da_Robótica], de sua autoria e que serviram de inspiração para toda uma vertente da engenharia robótica voltada a criação de Inteligências Artificiais dotadas de comportamento ético, culminando no pequeno e rudimentar robô chamado de Nao, da Aldebaran Robotics (http://www.aldebaran-robotics.com/), no ano de 2010, que foi a primeira máquina dotada de princípios éticos [Revista Scientific American Brasil, Ano 8, Número 102, Novembro de 2010], e, em meados do século seguinte, na criação e aprimoramento do Algoritmo Ozimov e de sua técnica de aplicação.
Optotrônica: no universo C7i os aparelhos como computadores e sistemas em geral não são mais baseados em eletrônica, ou seja, em semicondutores elétricos, mas em sua integralidade a tecnologia de informação de C7i é composta por equipamentos semicondutores de luz. Assim como a eletrônica de um aparelho são seus componentes semicondutores de elétrons, a optotrônica de um aparelho em C7i são seus componentes semicondutores de luz. Já a optoeletrônica, como a conhecemos hoje e que é ancestral da optotrônica de C7i, é o estudo e aplicação de aparelhos eletrônicos que fornecem, detectam e controlam luz, normalmente considerada um subcampo da fotônica. Nesse contexto, luz frequentemente inclui formas invisíveis de radiação como raios gama, raios-X, ultravioleta e infravermelho, em adição à luz visível. Aparelhos optoeletrônicos são transdutores “elétrico para ótico” ou “ótico para elétrico”, ou instrumentos que usam tais aparelhos em sua operação. Eletro-óptica é frequentemente usada incorretamente como sinônimo, mas é, de fato, um braço mais abrangente da física que lida com todas interações entre luz e campos elétricos, quer eles formem ou não parte de um aparelho eletrônico. A optoeletrônica é baseada em efeitos quânticos da luz em materiais semicondutores, às vezes na presença de campos elétricos.
Memluztores: ou memlightstores, em C7i são componentes optotrônicos equivalentes aos atuais componentes eletrônicos chamados memristores. Um memristor seria o quarto componente eletrônico fundamental - ao lado do resistor, do capacitor e do indutor - e teria propriedades que não poderiam ser duplicadas por nenhuma combinação desses três outros componentes. A propriedade mais importante desse componente é a "memresistência", o que na prática significa que o memristor é uma memória resistiva, que não perde os dados quando a energia é desligada. Um memluztor tem capacidade semelhante, ou seja, permitem que unidades de processamento (um computador quântico, um EpChip, etc.) ou de armazenamento (botdrives, holobubbles, etc.) sejam desligados de sua fonte de energia sem perder seus conteúdos de memória. O processo envolve nanofotônica e deriva da cristalização de fótons.
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Mais uma degustação de um livro em andamento, desta vez o Livro Zero, marco inicial da minha série Código 7 Infinidade. Para aqueles que curtem uma cientificamente bem embasada (ao menos me esforcei para isso) e dinâmica "space opera", com certo tempero de fantasia paranormal (mas que no decorrer da série se descobre não ser tão surreal assim), então este é um convite para você embarcar comigo em uma jornada eletrizante pelo Universo! Venha:
"Sabíamos que o mundo não mais seria o mesmo. Algumas pessoas riram, algumas pessoas choraram, a maioria ficou em silêncio. Recordei-me de uma passagem das escrituras hindus, o Bhagavad-Gita. Vishnu está a tentar persuadir Arjuna de que deve fazer o seu dever, e para o impressionar assume a sua forma de quatro braços e diz, 'Eu tornei-me a Morte, o destruidor de mundos.' Suponho que todos nós pensamos isso, de uma maneira ou de outra." — Robert Oppenheimer (Sobre a experiência "Trinity", o primeiro teste nuclear da História).
O Vigilante do Abismo
[MENSAGEM DE RÁDIO INICIADA - ONLINE]
18/Dez/2.143 : 23:15 Hora Padrão :
Missão: 01387 – Nave de Pesquisa e Resgate ESA VTX 71 Jacques-Yves Cousteau – Órbita de Júpiter.
Objetivo: localizar e, se necessário, abordar veículo sem registro oficial, que emite sinal de uma posição extremamente baixa na órbita de Júpiter.
Tripulação: Primeira Comandante Valkiria Valentina Cristoforetti, Segundo Comandante Coronel Marcus Alexander Stone, Piloto Tenente-Coronel Vladimir Vladimirovitch Plushenko, Engenheiro de Voo Trajano Stone Cristoforetti, Especialista de Missão (Logística, Exploração e Resgate) Major Sylvia McNamara, Especialista de Missão (Médica e Engenheira de Software) Doutora Jussara Maria Müller.
Situação Atual: em contato com o objeto estacionado na alta atmosfera do planeta Júpiter, ponto onde foi identificada a origem do sinal não reconhecido, recebido seis semanas atrás. Emitindo relatório em retrospecto mais o status atual da missão, pela Comandante Cristoforetti, a seguir.
Assinatura Criptográfica: Mensagem Oficial - Secreta - Emergência - CEI - W897234784329HEIU34309 - Sub-rotina IA de Acompanhamento Laterza-Orwell.
Segue Mensagem de Áudio: Há seis semanas o Consórcio Espacial Internacional, através das antenas do Cinturão de Asteroides pertencentes à Companhia Mineradora Himmels Polizei Adventures, começou a receber um sinal, provavelmente um radiofarol-de-emergência, de um veículo não registrado, posicionado em órbita extremamente baixa de Júpiter. A Cousteau foi imediatamente deslocada para prestar socorro, mas mesmo sendo os mais próximos, chegamos aqui apenas há cinco dias. O que encontramos foi perturbador. A fonte do sinal, uma imensa estrutura, está no centro do Olho de Júpiter, acessível através de um canal de calmaria no vasto furacão que, nós acreditamos, é gerado e mantido pela própria estrutura. Não pudemos compreender de onde ela veio, nem como se instalou. Cogitamos algumas teorias, e uma delas, baseada no contato sensorial inexplicável entre esse lugar e o Coronel Stone quando da segunda abordagem, feita ontem, é de que o Vigilante do Abismo, codinome que demos a esta estrutura... Sempre esteve lá... Desde os primórdios do nosso Sistema Solar. O sinal que captamos parece estar programado para se repetir a cada... Um milhão de anos, é nossa estimativa... Não compreendemos como a estrutura se mantém, mas há um ar de deterioração aqui, sem dúvida, apesar da presença de inúmeros autômatos de formas as mais estranhas, muitos dos quais parecem fazer a manutenção do lugar. Outra informação importante, os instrumentos de bordo do Vigilante parecem indicar, graficamente, que um outro sinal precedeu o radiofarol que captamos, e este sinal é disparado para fora do Sistema Solar. Nossas sondas automáticas confirmaram que este gigantesco aparelho gera, lá embaixo, na sua base, uma espécie de portal dimensional que permite viagens interestelares, pois as sondas voltaram com fotos de constelações cujas análises de paralaxe (1) indicam uma alteração de perspectiva de vários anos-luz... Atenção, aguardem, o portal estelar de Júpiter está se abrindo novamente, se expandindo, mas que...
[MENSAGEM DE RÁDIO INTERROMPIDA - ENDOFLINE]
Um Pai de Verdade
Quarenta e oito dias depois do encontro com o portal estelar do Vigilante do Abismo, o corpo do Coronel Marcus Alexander Stone estava prestes a se dilacerar, e ele sentia cada fibra de seus músculos estendida ao máximo, prestes a romper.
Certamente seu traje pressurizado se romperia antes, mas não tinha como fazer outra coisa, então Marcus rilhava os dentes, respirando entre eles, gotas de saliva respingando na parte de dentro do seu capacete, enquanto com a mão esquerda o homem se agarrava ao batente de uma das escotilhas da Cousteau, que flutuava e se despedaçava em órbita daquele moribundo planeta alienígena. Com a outra mão Stone segurava as mãos do rapaz que se debatia no vácuo, sendo sugado pela exótica força de convecção do portal estelar que o próprio jovem havia aberto, que sugava átomo a átomo das proximidades, arremessando-os para longe, para evitar que o monstro gigantesco e hediondo que estava se materializando através do portal se solidificasse em torno de outros corpos. Não havia como ambos os homens, o mais velho e o mais jovem, saírem vivos dali. Mas também não havia como Marcus ordenar que seu coração e seus músculos largassem seu filho, não tinha como abandonar Trajano! Não podia! Seu filho! O destruidor de mundos, o conjurador do monstro ancestral e assassino que chegava através do portal estelar, e que seria o flagelo de bilhões de vidas no planeta verdejante lá embaixo! Ainda assim um pai, um pai de verdade, não pode, não consegue soltar a mão de um filho que espuma, insano, raivoso, feroz, mas que ainda é seu filho.
— Trajano! — Vociferou em desespero Marcus Stone, pelo rádio. — Filho! Para isso! Para!
— Vão morrer, pai! — Urrou o jovem de volta. — Todos esses monstros vão morrer!
Repleto de Vida
Muito antes deste momento derradeiro de pai e filho, aos seis minutos, vinte e três segundos, e oito décimos depois do encontro com o portal estelar do Vigilante do Abismo, os alarmes de bordo dispararam em uníssono, e ecoaram por toda a nave, pois por uma fração de segundo seus sensores ativos indicaram que tudo na ESA VTX 71 Jacques-Yves Cousteau parou de funcionar. Foi somente por um instante, mas os alarmes não queriam saber, e berravam insistentes. O mesmo processo, ocorrido quando a nave atravessou o portal estelar de Júpiter, teve o efeito, sobre os nervos dos tripulantes, de um breve mas excruciante momento de dor.
— O quê?! O quê foi!!!... O que foi isso?? — Balbuciava, desorientada mas se esforçando para ficar em pé, Sylvia McNamara, a jovem e normalmente radiante especialista em resgates no vácuo. Seus longos e lisos cabelos castanhos estavam um tanto desgrenhados, e sua face de pele clara estava ainda mais pálida. Ela já salvara vidas inúmeras vezes em gravidade zero, e se orgulhava de nunca ter passado mal e sempre ter mantido o controle sob quaisquer que fossem as forças centrífugas, mas naquele instante a sala de comando da Cousteau girava loucamente. E, pelo espetáculo que podia ser visto através do grande monitor panorâmico frontal, isso ocorria literalmente, pois um campo de estrelas girava, alternando com a superfície verdejante de um planeta, e de volta às estrelas, sem parar. Sylvia teve que se conter para não pôr tudo do estômago para fora, virando o rosto para não mais ver o monitor.
— Todos estavam a bordo? Todo mundo a bordo? — Perguntava sem parar a Comandante Cristoforetti, falando a um minúsculo microfone cuja haste se estendia de um auricular posicionado em sua orelha direita. Ela estava sentada e presa pelos cintos de segurança em sua cadeira na sala de comando. — Plushenko! Plushenko! Perdemos estabilidade!
— Estou a caminho! — Veio a voz, decidida e firme, do piloto pelo sistema de comunicação, cujo tom indicava que ele estava correndo o melhor que podia em gravidade zero.
Por toda a cabine de comando objetos soltos flutuavam, ricocheteando de quando em vez, ou nas mulheres ou nas paredes e instrumentos.
— Sylvia! — Chamou a Comandante. — Tudo bem?
— Sim, comandante. — Disse McNamara, forçando um amplo sorriso para tranquilizar a outra, assim que entrou no campo de visão de Cristoforetti, cuja cadeira a mantinha apontada para a proa da nave, onde estava o monitor panorâmico. — Só com diversos arranhões, e os que doem mais estão no orgulho! Eu estava sem os cintos.
— Syl, por favor veja o que houve com o cilindro.
McNamara já havia se adiantado, eficiente como sempre, e, verificando um determinado painel, respondeu quase de pronto:
— Está reiniciando, desarmou. Assim que restabelecermos o momentum (2) da nave, a gravidade simulada deve voltar.
Valkiria Valentina Cristoforetti, com sua testa morena enrugada de tensão contida, e com seus grandes olhos escuros arregalados de atenção, mexia nos controles direcionais da Cousteau, tentando adiantar o serviço do piloto, e repetia no microfone:
— Todo mundo a bordo? Reportem! Todos a bordo? Ninguém em extra-veicular, pelo amor de Deus? Parece que mudamos de posição no espaço, não vejo o Vigilante... Nem... Júpiter...
O primeiro a chegar foi Vladimir Vladimirovitch Plushenko, que saltou para a cadeira do piloto como quem veste a melhor e mais querida roupa. Enquanto Trajano, Stone e Jussara se juntavam à eles, Vladimir conseguiu, aos poucos, reequilibrar a nave, usando com extrema perícia os jatos de manobra para ir influenciando o giro da Cousteau, até estabilizá-la. Instantes depois disso um solavanco indicou que o cilindro rotatório, que simulava por força centrífuga a gravidade, estava voltando a funcionar, e dez minutos depois todos conseguiam andar e se mover normalmente de novo.
— Muito bem, piloto. Agora vamos restaurar todos os sistemas! — Ordenou a comandante.
Trabalhavam juntos naquela nave há quase três anos. Eram uma família, e também eram como soldados muito bem treinados, pois no vazio do espaço, se um não cuida do outro, e se não são capazes de trabalhar com afinco e precisão sob quaisquer circunstâncias, as pessoas não sobrevivem muito tempo. Passaram então a hora seguinte verificando e desarmando um a um os alarmes que haviam sido disparados, de modo a terem certeza da integridade do seu pequenino mundo chamado Cousteau. Quando finalmente tudo havia voltado a relativa normalidade, e Jussara havia atestado que todos estavam de fato bem, sem ferimentos graves ou concussões, eles todos se acumularam diante do monitor panorâmico frontal da Cousteau, e olharam, fascinados, um planeta cheio de vida, coberto por amplas florestas, e grandes trechos de água, e que, visivelmente, não era a Terra.
Perigeu
Um dia, dezesseis horas e vinte e nove minutos depois do encontro com o portal estelar do Vigilante do Abismo, os alarmes de colisão da nave terrestre disparavam.
Estavam sobrevoando o planeta de uma longa órbita desde que chegaram, captando amplo escape de sinais de rádio vindos de terra, no entanto nada era passível de ser compreendido, embora as VRPs (3) de bordo não tenham parado de trabalhar um segundo em cima desses dados, e já tivessem conseguido identificar que eram sinais digitais, em essência parecidos com os nossos, o conteúdo em si ainda era ininteligível. Diversos artefatos em órbita, alguns até maiores que a Cousteau, emanando e refletindo esses sinais, indicavam uma civilização tecnológica. Mas os telescópios, mesmo os de mais longo alcance, não mostravam na superfície do planeta grandes cidades ou estruturas viárias. Nada, a não ser vestígios muito pouco nítidos do estruturas que poderiam ser pequenas aglomerações de casas ou construções de algum tipo, como pequeninas aldeias. Quando muito alguns pratos de antenas, parecidas com radiotelescópios (4) de porte médio, apareciam em montanhas que emergiam, aqui e ali, em meio a exuberante selva que cobria aquele belo e exótico mundo.
Havia ficado mais que evidente que estavam num outro sistema solar, visto que o planeta verdejante ali embaixo não poderia existir em lugar algum das cercanias da Terra, e que suas observações astronômicas não identificaram nenhuma constelação conhecida, mas mostraram que apesar de parecida, a estrela que orbitavam não era espectralmente (5) idêntica ao nosso Sol, e tudo indicava ser cercada por seis planetas. A Cousteau estava orbitando o quarto, que era cercado por sua vez por três luas, cada uma com cerca de um terço até a metade do tamanho da Lua da Terra.
Visto então que não havia para onde recuar, e que seus suprimentos vitais não durariam para sempre, e estavam mesmo chegando ao limite mínimo, por mais que estivessem bastante nervosos com a possibilidade de um primeiro contato com alienígenas, todos resolveram, após uma tensa reunião onde a Comandante quis a opinião de cada um dos tripulantes, se aproximar mais, entrando numa órbita elíptica tal que os levaria a, no ponto mais próximo ao planeta, passar pouco acima dos satélites artificiais daquele mundo. Faltavam algumas dezenas de quilômetros para atingirem esse ponto de máxima proximidade, e estavam todos com trajes pressurizados mas não lacrados, rostos à mostra, e a postos. Valkíria, Plushenko, Stone e Sylvia na cabine de comando, os outros no observatório a meia nau, prontos para sobrevoar, analisar, filmar e fotografar o novo mundo e seus satélites, quando o alarme de colisão começou a tocar! A voz monótona de uma das VRPs não autoconsciente dizendo sem parar, até ser desligada, "Colisão! Alerta! Colisão! Tomar medidas evasivas! Colisão! Alerta!".
— O que é, Vladimir? — quis saber a Comandante Valkíria, de sua cadeira no centro da cabine, e sabendo que o alarme só dispararia no caso de uma iminente catástrofe. Algo grande estava vindo.
— Não é visível ainda, e meus sensores não identificam nenhum radiofarol.
— Sylvia?
— O radar de proa disparou o alarme. Ele indica que algo vem da superfície em alta velocidade, — Respondeu prontamente McNamara — e está em trajetória balística de interceptação, deve nos atingir em cheio no nosso perigeu (6). Míssil? Outro ônibus espacial deles por acaso em nossa trajetória?
— Piloto.
— Alterando a rota. Recalculando trajetória… — Vladimir Vladimirovitch levantava as espessas e escuras sobrancelhas, e como sempre, ficou com o rosto pálido ligeiramente ruborizado quando se concentrava no monitor do seu computador — Sylvia, me passa as atuais posições dos satélites artificiais. Não posso desviar de uma coisa e esbarrar em outra.
— Feito.
— Pronto, vamos passar a cerca de vinte quilômetros do tal míssil. — afirmou o piloto, enquanto todos ouviam o rumor dos propulsores de manobra alterando o curso da nave.
— Não vamos não, — retorquiu McNamara — o míssil alterou a rota também, e voltou a mirar em nós. Colisão em doze minutos, trinta e três segundos e seis décimos.
— Equipe do observatório. — Chamou o Segundo Comandante Marcus Stone, pelo intercomunicador — Alguém conseguiu definir o que é isso que vem em nossa direção?
— Algum tipo de foguete! Tem a forma de um grande míssil mesmo. — Respondeu Trajano de volta. — Os filhos da puta estão atirando em nós!
— Piloto. — Chamou a Comandante Valkíria.
— Vou fazer o possível.
— Todos prontos para eventual colisão e despressurização! — Disse, quase gritando, Valkíria, também ao intercomunicador, para todos ouvirem.
— Vladimir, use os satélites deles de escudo! — Sugeriu Marcus. Ao que recebeu um tenso e reprovador olhar de sua esposa, a Comandante. — Prefere morrer aqui, Val?
— Não, piloto siga a ordem do Segundo Comandante!
— Sim! Desligando cilindro rotatório, assumindo controle manual total.
Quase que imediatamente, enquanto o cilindro que simulava gravidade ainda estava finalizando sua imobilização, e a tripulação mal começava a perder a sensação de peso, a nave terrestre guinou. Foguetes de manobra cuspindo fogo intensamente, seus ocupantes pressionados contra seus assentos abruptamente, e os propulsores principais incandescendo num rubro azulado radiante. Por dentro do veículo toda a sua estrutura guinchando, chegando próxima de seu ponto máximo de estresse, símbolos de alerta espocando nos painéis de controle.
— Vladimir!... Vladimir!... Vladimiiiir!... — Repetia a Comandante, sem conseguir se conter, enquanto uma das grandes estações orbitais alienígenas assomava, crescendo subitamente no monitor panorâmico frontal da cabine de comando. Nem mesmo a experiência de Valkíria, que já voava há anos com o russo temerário, lhe fez acreditar que não bateriam em cheio. Mas Vladimir Vladimirovitch Plushenko tinha poucos rivais na pilotagem. Passaram, talvez, há pouco mais de cinco metros abaixo da estação extraterrestre, chamuscando aquela estrutura com os jatos da Cousteau. Mas o visual, depois dessa manobra, não tranquilizou ninguém. A nave da Terra mergulhava, como um bólido, bem dentro do setor da órbita daquele planeta mais apinhado de satélites e de tráfego.
— Syl, e o míssil? — Quis saber Valkiria, agarrando-se a cadeira de comando, onde já estava presa por seus cintos.
— Ainda mirando em nós. Ele tem uma manobrabilidade provavelmente superior a nossa, mesmo com Vlad pilotando! Sete minutos para impacto!
— Marcus, podemos lançar algo em nosso rastro?
— Não, Comandante, essa nave não foi feita pra isso, não temos o que ejetar e se abrirmos alguma comporta explodimos. Vladimir, outra sugestão, entre naquela zona de tráfego intenso, e reduza!
— O quê?! — Disse o piloto, incrédulo no que seu Segundo Comandante lhe dizia. Vladimir podia ver o míssil agora, cada vez mais próximo.
— Não vamos escapar daquilo! — Stone gritava — Isso aqui não é um caça! Com um caça eu aposto que você escapava de um míssil, amigo, mas com isso aqui, não! Para no meio deles e reza pra eles não matarem sua própria gente!
Olhando de um homem para o outro, a Comandante suspirou, tensa, e disse:
— Cumpra, Vlad!
A Jacques-Yves Cousteau acionou com uma pequena explosão seus retrofoguetes, desacelerendo o mais rápido que pôde, por cerca de dois minutos sua tripulação foi submetida a intensa força inercial, alguns quase desmaiando. A nave terrestre mergulhou então no maior fluxo de veículos que pareciam transportar coisas ou pessoas ou ambas do solo lá embaixo para as estações orbitais, e entre estas. As navetas de transporte alienígenas, usando claramente foguetes de manobra também, se acomodaram aos poucos à presença da Cousteau, o fluxo era tão intenso ali que se saíssem muito de suas trajetórias, seria o caos. Um som melódico como um vibrante e cada vez mais intenso sino, cujos repiques aconteciam com cada vez menos tempo entre eles, plaaam, plaaam, plaaam, indicava a aproximação fatal do míssil.
— Lá vem ele. — Disse a Major Sylvia McNamara, contendo uma risadinha nervosa. Sylvia sempre tinha vontade de rir quando estava ansiosa, fazia parte de seu jeito jovial e quase sempre radiante. Apesar de amar a jovem quase como uma filha, a Comandante não conseguia evitar de se irritar com esse tique nervoso de McNamara.
O radar repicava: plaaam!... Plaaam!
— Atenção. Preparem-se para o impacto! Selem os trajes! — Ordenou Valkíria ao intercomunicador, enquanto, assim como todo resto da tripulação, fechava o visor do capacete de seu traje pressurizado, embora ele fosse fechar sozinho ao menor sinal de despressurização, e prendia o tanque de oxigenação no encaixe frontal de seu traje, para poder continuar sentada e presa em sua cadeira. — Rádios dos trajes ok?
Um a um os tripulantes confirmaram, rapidamente, que estavam com trajes fechados e que, portanto, estavam ouvindo por seus rádios individuais a voz da Primeira Comandante. Todos em contato.
Plaaam!... Plaaam! Plaaam!
— O diabo do míssil é enorme… — Sussurou Sylvia, mas todos, evidentemente, puderam ouvir. Percebendo isso ela completou: — É quase o triplo da Cousteau. Nuclear?
Plaaam! Plaaam! Plaaam! Plaaam!
Evidentemente, nos últimos instantes, Vladimir Vladimirovitch girou a nave, numa tentativa de minimizar a área de impacto e os danos, deixando os tanques de combustível no ventre da nave do outro lado, e inclinando a forte blindagem dorsal dos motores contra o míssil.
PlaaamPlaaamPlaaamPlaaamPlaaam!
— Não vão parar… Tem um monte de gente deles em torno de nós, e eles não vão parar... — Disse o piloto enquanto fazia a manobra. A tela panorâmica da ponte de comando ainda mostrando a visão da câmera externa na direção de onde vinha o míssil, um monstro cavalgando chamas intensamente rubras, como alguma máquina apocalíptica medonha que se agigantava, agigantava, agigantava, um pequeno sol prestes a surgir na órbita daquele planeta, nada poderia impedir isso.
A comandante fechou os olhos, dolorosamente impotente. Sylvia ria baixinho, em algum lugar. Plushenko murmurava algo em russo. Stone jazia em profundo silêncio. Lá do observatório, era chegada também a hora em que nada mais soava tolo, e Jussara disse que sentiria falta de todos e Trajano gritou algo sobre amar.
Plaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaammmmmmmmm!!! Valkíria esticou a mão e agarrou a de Marcus. E foram todos engolidos por um imenso clarão na silenciosa e fantasmagórica explosão no espaço.
CONTINUA...
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Notas de Rodapé:
(1) Paralaxe: é utilizada, na astronomia, para definir a diferença na posição aparente de um objeto visto por observadores que se encontram em locais diferenciados. A palavra Paralaxe tem sua origem no idioma grego e significa alteração. Na astronomia, o termo corresponde à alteração da posição angular que ocorre entre dois pontos estacionários relativos quando vistos por um observador em movimento. Isto significa que ocorre uma aparente alteração em relação à posição de um objeto quando um observador varia o fundo de observação. Uma utilização prática da Paralaxe na astronomia é referente ao cálculo feito para medir a distância das estrelas tendo como base o movimento da Terra em sua órbita, é a chamada paralaxe estrelar. Já a paralaxe anual tem sua definição a partir da diferença de posição de uma estrela vista a partir do Sol e a partir da Terra. É importante para os cálculos que determinam distância em anos-luz. Calcula-se então o parsec que corresponde à distância para a qual a paralaxe anual é de um segundo de arco, também chamado arcseg. Cada parsec equivale a 3,6 anos-luz. É importante destacar que não é possível ver uma estrela a partir do Sol, em função disso, a observação é feita a partir de dois pontos opostos da órbita do planeta Terra e o resultado obtido é dividido por dois. A distância que um objeto possui em parsecs pode ser calculada do inverso de sua paralaxe. O resultado da paralaxe é obtido através da divisão da unidade astronômica, que corresponde à distância média da Terra ao Sol, pela distância até a estrela desejada. O valor encontrado é multiplicado por 180 e pelo resultado da divisão de 3600 por PI. O resultado dessa conta é dado em arcseg. (Dicionário Informal: http://www.dicionarioinformal.com.br/paralaxe/)
(2) Momentum: Em Física significa o produto da massa pela velocidade do corpo; impulso; quantidade de movimento. Também significa força, ímpeto, pique. (Dicionário Informal: http://www.dicionarioinformal.com.br/momentum/)
(3) VRP (Virtual Reality People): Toda e qualquer Inteligência Artificial (I.A.), pois todas são baseadas em um mesmo sistema algorítmico, conhecido como Vínculo Matriz-Conceito de Maia (Maia - 2010), ou Algoritmo de Maia. Uma VRP é uma "pessoa sintética", que pode ter as mesmas capacidades intelectuais de um humano, ou ser muito superior, intelectualmente, a este. Uma VRP ainda pode existir somente como um software dentro da VRnet, ou ter toda uma estrutura de hardware, que pode ser um poderoso computador quântico ou um optoeletrônico EpChip (encefaloprocessadores Matriciais). Por força de Lei Constitucional Mundial, toda VRP deve ter seus algoritmos (o essencial Algoritmo de Maia e todos os paralelos) dependentes do Algoritmo Ozimov, que é uma técnica que consiste em um algoritmo de aprendizagem de máquina, cuja função abstracional está focada na identificação de contexto de situações decisórias da Inteligência Artificial na qual está implantado, sopesando tais decisões de acordo com três critérios a saber: quanto bem causa, quanto mal causa, e quanta justiça gera. Como os instintos mais básicos e inescapáveis do ser humano, numa VRP o Algoritmo Ozimov está na raiz de cada decisão e recorre a um banco de dados de situações éticas básico mas amplo, que, no entanto, vai crescendo de acordo com a vivência da máquina. Ou seja, a máquina não toma nenhuma atitude sem que esta passe primeiro pelo Algoritmo Ozimov (isso está garantido tanto por estruturas de software quando de hardware dedicado ou não, e está previsto em cláusula da Constituição Mundial como de uso obrigatório, sendo crime gravíssimo a fabricação de robôs sem essa salva-guarda. Vale notar que, não raro, a Agência Código 7 usa VRPs de vários tipos, de robôs a softwares, sem ou com uma versão o Algoritmo Ozimov modificada, que permite, por exemplo, que seus robôs de segurança portem armas mortais e façam uso delas), e quanto mais atitudes éticas a máquina sopesa e compreende, mais refinado fica o algoritmo. O nome do algoritmo é a pronúncia do sobrenome em russo do bioquímico e escritor de ficção científica Isaac Asimov [WikiPédia: http://pt.wikipedia.org/wiki/Isaac_Asimov], criador de contos e romances protagonizados por robôs que seguiam fundamentalmente as Leis da Robótica [WikiPédia: http://pt.wikipedia.org/wiki/Leis_da_Rob%C3%B3tica], de sua autoria e que serviram de inspiração para toda uma vertente da engenharia robótica voltada a criação de Inteligências Artificiais dotadas de comportamento ético, culminando no pequeno e rudimentar robô chamado de Nao, da Aldebaran Robotics (http://www.aldebaran-robotics.com/), no ano de 2010, que foi a primeira máquina dotada de princípios éticos [Revista Scientific American Brasil, Ano 8, Número 102, Novembro de 2010], e, em meados do século seguinte, na criação e aprimoramento do Algoritmo Ozimov e de sua técnica de aplicação.
(4) Radiotelescópio: Constrastando com um telescópio óptico, que produz imagens a partir da luz visível, um radiotelescópio observa as ondas de rádio emitidas por fontes de rádio, normalmente através de uma ou um conjunto de antenas parabólicas de grandes dimensões.(Wikipédia: http://pt.wikipedia.org/wiki/Radiotelesc%C3%B3pio)
(5) Espectroscopia Astronômica: é a técnica de espectroscopia usada na astronomia. O objeto de estudo é o espectro de radiação eletromagnética, incluindo luz visível, que irradia de estrelas e outros corpos celestes. Espectroscopia pode ser usada para determinar muitas propriedades de estrelas distantes e galáxias, como suas composições químicas. (Wikipédia: http://pt.wikipedia.org/wiki/Espectroscopia_astron%C3%B4mica)
(6) Perigeu: (Astronomia) ponto da órbita de um astro ou satélite em torno da Terra, no qual ele se encontra mais próximo de nosso planeta. (Wikidicionário: http://pt.wiktionary.org/wiki/perigeu)